‘Mestre Graça’ e o ‘príncipe dos poetas’ Jorge de Lima foram dois notáveis da literatura brasileira.
As obras literárias dos escritores alagoanos Graciliano Ramos (1982-1953) e Jorge de Lima (1893 – 1953) entraram em domínio público no dia 1º de janeiro. As produções deles ficaram livres para serem usadas e reproduzidas por qualquer pessoa sem pagamento de direitos autorais.
Segundo a lei brasileira, os herdeiros de um autor detêm plenos direitos sobre sua obra apenas nos 70 anos seguintes à sua morte. Como Graciliano Ramos e Jorge de Lima morreram em 1953, qualquer pessoa tem direito de imprimir e vender a sua própria edição das obras originais a partir de 2024.
Apontado como o maior escritor de ficção da escola modernista, foi na segunda fase que o Mestre Graça se consagrou. Alagoano de Quebrangulo, Graciliano nasceu em 27 de outubro de 1982 em uma família de classe média e narrou o sertão nordestino, denúncia de mazelas e desigualdades. Seu livro mais famoso é Vidas Secas.
O neto do Mestre Graça, Ricardo Ramos Filho, avaliou de maneira positiva o domínio público como forma de facilitar o acesso às obras do escritor, mas criticou a comercialização das obras. “É muito bom que o Graciliano possa ser acessado em sites, na internet, no site domínio público, que a obra do Graciliano esteja acessível ao leitor de forma gratuita. Isso deixa a gente muito feliz. O que a gente critica no domínio público é a comercialização da obra”, disse.
“Quando uma editora publica um livro que está em domínio público e não paga direito para a família, o público em si não ganha nada com isso. O livro não ficou mais barato porque entrou em domínio público. Então, na realidade, é como se, por um passe de mágica, as editoras se transformassem em herdeiras do escritor e começam a sair, às vezes, edições não autorizadas, inéditas, com pouco cuidado. Coisas que o autor talvez não concordasse que fossem editadas”, afirmou.
As obras de Jorge de Lima também entraram em domínio público neste ano. Natural de União dos Palmares, ele nasceu no dia 23 de abril de 1893. Passou sua infância na cidade natal e, em 1902, se mudou com a família para Maceió. A casa que o príncipe dos poetas morou na capital recebeu seu nome e é a sede da Academia Alagoana de Letras.
O ensaísta e historiador Rosalvo Acioli falou sobre a importância das obras de Jorge de Lima dentro e fora do Brasil. “Jorge de Lima é um autor essencial na literatura alagoana e brasileira e até mesmo universal. Tem uma obra magnífica tanto na poesia como na crônica, no romance, no conto e também no ensaio”, afirmou.
Para o presidente da Academia Alagoana de Letras, Alberto Rostand Lanverly, o domínio público vai fazer com que mais pessoas tenham acesso às obras dos escritores alagoanos. “Possibilitando leitura, estudo e disseminação sem restrições legais, contribuindo para preservação e difusão da cultura, permitindo que um público mais amplo desfrute, se beneficie do legado literário dos grandes alagoanos”, disse.
O jornalista e escritor Claufe Rodrigues, que se aprofundou na vida e na obra dos dois alagoanos, avaliou o cenário atual. “Quem perde é a família, que deixa de arrecadar os direitos autorais que as editoras teriam que pagar a elas. Quem ganha com isso? O público de uma certa maneira, mas se você procurar na internet, já encontra lá as obras de Graciliano Ramos na internet, gratuitamente. Você tem acesso à isso já. Mas quem ganha mesmo são as editoras, que podem fazer as edições que quiserem dos livros”, afirmou.
Editoras já anunciaram que vão reeditar alguns títulos de Graciliano e Jorge de Lima. Já em relação às adaptações, a legislação garante que os adaptadores recebam pelos direitos autorias, desde que sejam mantidos os direitos morais do autor da obra original.
O advogado Antônio Ugá, membro da Comissão de Direito Cultural da OAB-AL, explica que as obras em domínio público podem ser reproduzidas, mas não alteradas.
“Não prescreve o direito autoral em si, que é um direito moral. Então você sempre vai ter que creditar o autor como autor daquela obra. Até hoje Hamlet é uma adaptação de Shakespeare. Você vai ter que dar esse crédito ao autor, mas a exploração comercial passa a ser também possível”, explicou.